Psicologia Online: Possibilidades do séc.XXI
Da necessidade à prática
A psicologia como ciência que estuda/intervém ao nível da regulação emocional, de pensamentos, comportamentos e afectos humanos, tem tido um crescimento exponencial ao longo dos anos. A consciencialização para a necessidade em repor equilíbrios entre a realidade interna e externa de cada indivíduo , a necessidade em auto-cuidar tem surgido como necessidades dos indivíduos integrados nas sociedades atuais e por isso cada vez mais trabalhadas com as comunidades.
Até há duas décadas atrás, ter acesso a consultas de psicologia significava o indivíduo necessitar de se deslocar até ao consultório para beneficiar de sessões desta especialidade. Com o avanço das novas tecnologias, esta realidade alterou-se. A Organização das Nações Unidas (ONU, 2009) divulgou relatórios onde referem que o número de utilizadores com acesso à internet aumentou consideravelmente nos últimos 20 anos, sendo que até 2011 o número ultrapassava os 78 milhões de pessoas com acesso à internet. Com este boom nas tecnologias de informação, aliado a situações como pandemias, como foi o caso do COVID-19, a utilização da internet para gerir situações do quotidiano nomeadamente ao nível da educação (aulas online, vídeo conferências), saúde (teleconsulta), financeiro (aplicações de gestão de contas) entre outros, tornou-se uma necessidade.
Vantagens das Consultas de Psicologia Online
No entanto, e apesar de todos estes avanços tecnológicos, na hora de escolher entre acompanhamento presencial ou online, psicólogos e clientes muitas vezes se questionam sobre a eficácia e efetividade do uso do canal virtual para trabalhar a saúde mental.
Vários estudos científicos na área da psicologia têm sido realizados por forma a desenvolver um maior entendimento sobre a eficácia e efetividade do conceito E-Mental Health (Tecnologias de Informação e Comunicação para a Saúde). Os resultados apontam para (Pinto, 2002; Anderson & Tito, 2014; Figueiredo, 2007; Sander, Rauschenberg & Baumeister, 2016) vantagens:
- Quando existem dificuldades no acesso a uma consulta presencial de Psicologia, seja por distanciamento geográfico ou por impedimento físico;
- Para pessoas que viajam com frequência ou que tenham mudado de residência e queiram continuar o acompanhamento psicológico online;
- Quando as pessoas têm familiaridade com as novas tecnologias;
- O anonimato oferecido pelo canal virtual, permite que as pessoas beneficiam de acompanhamento psicológico sem estarem expostas aos outros, o que muitas vezes leva as pessoas a não procurarem ajuda;
- É capaz de proporcionar às pessoas amparo (contenção), manutenção (manter) e possibilidade de transformação da experiência emocional baseado na relação terapêutica (relação entre o psicólogo e o cliente no sentido de ultrapassar o sofrimento do cliente – Bordin, 1979.).
A entidade reguladora da profissão de psicólogo(a) português, a Ordem dos Psicólogos Portugueses, aquando da sua formação elaborou, mantém e atualiza o código de ética e deontologia aprovado pela Lei n.o 57/2008, de 4 de Setembro. A 25 de Março de 2011 é aprovado o Regulamento que aprova o Código Deontológico da Ordem dos Psicólogos. Ora neste código de ética e deontologia são considerados princípios para uma actividade de excelência por parte do profissional de psicologia como sejam:
- Princípio A – Respeito pela dignidade e direitos da pessoa;
- Princípio B – Competência;
- Princípio C – Responsabilidade;
- Princípio D – Integridade;
- Princípio E – Beneficência e não-maleficência;
- Princípios específicos – consentimento informado, privacidade e confidencialidade, relações profissionais, entre outros.
Todos estes princípios, independentemente do canal utilizado, presencial ou online, deverão ser considerados. No entanto, quando o canal escolhido é o online, destaca-se a necessidade do profissional informar o cliente sobre os limites específicos deste tipo de intervenção como sejam da confidencialidade e privacidade, uma vez que virtualmente poderão ocorrer situações ocultas que o psicólogo não dispõem de meios de controlo que garantam a total confidencialidade e privacidade.
Abordagens Psicológicas e Áreas de Intervenção
Em Psicologia existem várias abordagens com técnicas diferentes de pensar e de trabalhar a nossa saúde mental.
Das abordagens mais investigadas na área E-Mental Health tem sido a abordagem Cognitivo-comportamental (pensamento, emoção e comportamento) e revelado eficácia em quadros (Kumar et al., 2017):
- Depressão;
- Perturbação de Ansiedade Generalizada;
- Ansiedade Social;
- Perturbação de Pânico;
- Fobias;
- Comportamentos Aditivos;
- Perturbações de Ajustamento;
- Transtorno Bipolar;
- Perturbação Obsessivo-Compulsiva.
A abordagem psicanalítica ou dinâmica também se tem revelado promissora na utilização das tecnologias de comunicação e informação para a saúde, especificamente na videoconferência. Os psicanalíticos referem que, tanto presencial como por vídeo, o conteúdo a ser analisado é o mesmo: tom de voz, interrupções, transferências e contratransferências, ritmo da fala, entre outros. (Fishkin et al.2011).
Apesar de avanços significativos nesta área de E-Mental Health existem limitações a considerar quando falamos de situações como surtos psicóticos que deverão ser imediatamente assistidos em instituições hospitalares (urgências).
Em suma, consultar um psicólogo online é, na verdade, uma alternativa válida para quem necessita de ajuda para com a sua saúde mental.
BibliografiaAndersson, G., & Titov, N. (2014). Advantages and limitations of internet-based interventions for common mental disorders. World Psychiatry, 13(1), 4–11. doi:10.1002/wps.20083.
Bordin E. S. (1979). The generalizability of the psychoanalytic concept of the working alliance. Psychotherapy (Chic.) 16, 252–260.
Figueiredo, L.C. Confiança: a experiência de confiar na clínica psicanalítica e no plano da cultura. Revista Brasileira de Psicanálise,v. 41, n. 3, p. 69-87, 2000.
Fishkin, R.; Fishkin, L.; Leli, U.; Katz, B.; Snyder, E. Psychodynamic treatment, training, and supervision using internet-based technologies. Journal of the American Academy of Psychoanalysis and Dynamic Psychiatry, v. 39, v. 1, p. 155-168, 2011.
Kumar V, Sattar Y, Bseiso A, Khan S, Rutkofsky IH (2017). The effectiveness of Internet-based cognitive behavioral therapy in treatment of psychiatric disorders. Cureus.
Pinto, E. R. As modalidades do atendimento psicológico online.Temas em Psicologia da SBP, v. 10, n. 2, p. 167-178, 2002.
Sander, L, Rauschand, L., & Baumeister, H. (2016). Effectiveness of Internet and mobile-based psychological interventions for the prevention of mental disorders: A systematic review and meta-analysis protocol. Systematic Reviews, 5 (30). doi:10.1186/s13643-016-0209-5.